domingo, 1 de novembro de 2009

Polícia mata, omite seus mortos e fica impune

A polícia brasileira é cada vez mais letal. Segundo a historiadora Ângela Mendes de Almeida, coordenadora do Observatório das Violências Policias de São Paulo (OVP- SP), no entanto, o número de mortos por agentes do Estado é ocultado e embaralhado. “Nenhum órgão oficial quer contar, com métodos científicos, os mortos”, completa.

Nesse sentido, o OVP-SP contabiliza as mortes cometidas por policiais no Estado de São Paulo, que não entram nas estatísticas oficiais da Secretaria de Segurança Pública, através de um levantamento diário de notícias veiculadas em aproximadamente 100 jornais. Assim, aos 272 civis mortos por policiais divulgados pelo Governo do Estado no primeiro semestre, um levantamento da OVP- SP acrescenta mais 149 óbitos provocados por agentes do Estado.

As formas de execução, segundo Ângela, são variadas: “temos a ‘morte em confronto’, que é o homicídio frequentemente praticado por agentes do Estado fora de serviço, quando estão em bicos irregulares e em atividades privadas; a morte por bala perdida, casos que só acontecem em bairros pobres e favelas; as chacinas executadas por encapuzados ou homens de negro que nada mais são do que grupos de extermínio formados por policiais; e a perseguição tresloucada a um suspeito, quando não hesitam em colocar em risco a vida dos habitantes dos territórios da pobreza”.

Não contabilizados

Porém, dentre todas as circunstâncias apontadas por Angela, muitas não entram nos números oficiais das secretarias, já que ela não contabiliza as mortes provocadas por outros agentes do Estado, tais como: guardas civis metropolitanos, policiais rodoviários federais e todos os assassinatos cometidos por policiais encapuzados, organizados em grupos de extermínio.

Nesse sentido, a adolescente de 17 anos, Ana Cristina Macedo, vitimada por bala perdida durante uma perseguição da polícia civil no dia 31 de setembro, na Favela de Heliópolis, na zona sul de São Paulo, não teve sua morte atribuída a um agente do Estado, mesmo comprovado que o disparo foi efetivado por um. A morte de Ana Cristina é contabilizada junto aos homicídios culposos.

É o que explica a advogada do Programa de Justiça da Conectas Direitos Humanos, Marcela Fogaça Vieira. “Esses números não englobam os casos de homicídios dolosos ou culposos cometidos por policiais, que são diluídos no número geral de homicídios. Ou seja, o número de homicídios cometidos por policiais é mais elevado do que aqueles oficialmente divulgados”.

Procurada, a Ouvidoria da Policia Militar de São Paulo, não quis dar explicações sobre as maneiras da contagem de civis vitimados pela Polícia.

Dossiê preparado por diversas organizações sociais, entre elas o OVP- SP, sobre execuções extrajudiciais e mortes pela omissão do Estado de São Paulo, lançado no dia 9 de outubro, dia mundial contra a pena de morte, traz observação do relator da ONU para execuções sumárias, Philip Alston, constatando “que as polícias de São Paulo utilizam a força letal e não a inteligência para controlar o crime. Mais do que isso, esta força letal é utilizada para a proteção do patrimônio e não da vida”.

“Caatinga mata!”

Na Bahia, a situação não é diferente. Segundo Carla Akotirene, assistente social e coordenadora do Fórum Nacional de Juventude Negra, a frase “Pai faz, Mãe cria e Caatinga Mata!” vem exposta nas viaturas da Polícia da Caatinga, “uma divisão policial assassina, conhecida por abordagem violenta”.

Segundo o Centro de Documentação e Estatística Policial, em 2008, pelo menos 2.237 pessoas foram assassinadas em Salvador e região metropolitana. Números, divulgados de maneira generalizada, e que segundo Carla esconde os dados reais da repressão policial na Bahia. “Dentre estes números cabíveis institucionalmente, escondem-se milhares de homicídios praticados pelos aparelhos de repressão em seus diversos departamentos, não computados à ação policial”, denuncia.

Na ação da Polícia da Caatinga está a maior prova, segundo ela, da mentirosa divulgação dos números pelo governo baiano. “Sobre a Polícia da Caatinga, não há sequer dados estatísticos, uma vez que a totalidade das notícias enaltece a corporação e o alto índice de letalidade, cada vez mais assustador produzido contra os corpos negros e jovens”, aponta.

À frente da Campanha contra o Extermínio da Juventude Negra, lançada na primeira semana de outubro na Bahia, Carla aponta um viés ideológico acintoso que se tornou jargão na Bahia. “A afirmação de que aqui morre mais negros por conta do contingente populacional ser majoritariamente de afrodescendentes pode ser encontrado em documentos oficiais e em declarações dos gestores e agentes da segurança pública do Estado baiano, independente da conjuntura política ideológica”, declara.

Carla diz que a afirmação é uma falácia e apresenta outra premissa: “é uma tentativa de classificar a seletividade do sistema de justiça criminal como uma mera coincidência, escondendo a gênese desse sistema que foi formado para oprimir a população negra e pobre”.

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